A Constituição Federal é categórica ao afirmar que o servidor será reintegrado ao cargo quando sua demissão for considerada nula (artigo 41, §2º). Contudo, deixou de assinalar quais seriam os efeitos específicos da reintegração, de modo que esse papel coube às legislações federais e estaduais, bem como à construção doutrinária e jurisprudencial brasileira.
24Nesse contexto, cabível a análise de alguns pontos fundamentais da temática, tais quais os efeitos financeiros e funcionais da reintegração, eventual extensão desses benefícios quando a função é comissionada, o início da contagem do prazo prescricional e as medidas judiciais cabíveis para alcançar a eficácia desses efeitos.
Primeiramente, conceitua-se a reintegração como uma modalidade de reingresso no cargo público após a extinção da relação estatutária vigente entre Estado e servidor, decorrente de determinado fato jurídico que, nesse caso, é a reversão do ato demissório, seja administrativa ou judicial.
Essa é a mesma conceituação trazida pela Lei Federal nº 8.112/1990, e replicada em diversas das normas estaduais que regem os respectivos regimes do funcionalismo público civil. A referida lei federal elenca que, como efeito corolário da reintegração, haverá de ocorrer o “ressarcimento de todas as vantagens” ao funcionário público.
Tais vantagens devem ser entendidas como todos os vencimentos, direitos e vantagens funcionais que foram suprimidos durante o período de ilegal afastamento do servidor, aí incluídas as vantagens pessoais, as típicas do cargo e as econômicas.
Nessa esteira, é entendimento do Superior Tribunal de Justiça que “ao Servidor Público reintegrado são assegurados, como efeito lógico, todos os direitos de que fora privado em razão da ilegal demissão, inclusive os vencimentos retroativos”, percepção da qual também retira-se a nítida retroatividade dos efeitos da decisão, os quais devem ser considerados a partir do ato demissório anulado.
Outro ponto de construção da jurisprudência brasileira, já consolidado, é que o período pelo qual o servidor ficou afastado da função deve ser reconhecido como tempo de contribuição para obtenção de eventuais direitos que lhe socorram, tais quais a aposentadoria ou a licença-prêmio, devendo ser computado ainda para efeito de processos promocionais.
O ponto chave do raciocínio, como se vê, é que não pode ser o servidor responsabilizado pela falha ou desídia da Administração que tenha implicado na sua ilegal demissão, fazendo jus, portanto, a tudo aquilo que poderia ter gozado caso estivesse efetivamente trabalhando.
É dizer, empregam-se esforços para que a situação fática e jurídica retorne ao status quo ante, preservando-se os direitos que existiam ou deveriam existir.
Por essas razões, o servidor que, além do cargo efetivo, ocupava também função comissionada decorrente desse cargo terá direito ao ressarcimento dos valores relativos à função comissionada, nada obstante essa estar vinculada, conceitualmente, à discricionariedade da Administração Pública.
Isso porque, sem olvidar da possibilidade de afastamento ad nutum, conclui-se que o mesmo poderia, da mesma maneira, ter continuado a exercer suas funções extras normalmente caso não sobreviesse demissão injusta.
Outrossim, evidente que nesses casos o afastamento da função gratificada é mera decorrência do ato demissório. Desse modo, uma vez anulado, devem ser considerados nulos também seus atos subsequentes, aqui inclusa a dispensa da função comissionada, tornando mandatória a incorporação, à indenização pleiteada, do salário e das as vantagens adquiridas no período em que exerceu o cargo efetivo com função comissionada.
A respeito das medidas judiciais cabíveis para buscar os direitos narrados até aqui, há certo debate acerca da possibilidade de que o mandado de segurança ajuizado para reverter um ato demissório — implicando na reintegração —produza efeitos patrimoniais em relação a período pretérito ao ajuizamento.
Tal debate exsurge das vedações impostas pelas súmulas 269 e 271 do STF, que impedem a utilização do mandado de segurança como ação de cobrança e também a referida produção de efeitos econômicos relativos ao período anterior à impetração.
A propósito, o Supremo Tribunal Federal manifestou-se no sentido de que a decisão, em mandado de segurança, que anula o ato demissório e determina a reintegração, cuida meramente de reconhecer “direito líquido e certo da impetrante que teve como consequência o cumprimento de uma obrigação de fazer à Administração Pública, não se confundindo com a cobrança de valores anteriores à impetração do mandado de segurança, motivo pelo qual não se aplica, ao caso, o entendimento consolidado nas súmulas 269 e 271”.
Nesse contexto, entende-se que, uma vez reconhecido o direito à reintegração pela via judicial ou administrativa, caberia à Administração Pública, de ofício, a imediata recomposição dos prejuízos do servidor, em observância aos princípios constitucionais que regem a atuação do Estado.
Contudo, a praxe demonstra que a Administração se queda inerte em grande parte desses casos, limitando-se a acatar a decisão do Judiciário em reincorporar o indivíduo aos quadros do funcionalismo público sem, com isso, ressarci-lo devidamente.
Nessas hipóteses, cabe ao servidor público reintegrado, novamente, a busca de seus direitos pela via judicial, por meio de ação ordinária. Destaca-se que o prazo prescricional não iniciará na data do ato demissório, e, sim, no momento em que se torna possível ao sujeito insurgir-se contra a situação ilegal que, in casu, consubstancia-se na publicação da decisão administrativa ou judicial que reconhece a ilegalidade da demissão e determina sua reintegração ao cargo.
Por fim, feitas essas considerações, necessário destacar também que se entende pela possibilidade de que o ressarcimento devido seja pleiteado pelo servidor em sede de medida liminar na ação ordinária, considerando tratar-se de recebimento de verbas de natureza alimentar, da qual exsurge nítido o perigo de dano decorrente do não recebimento imediato.
FONTE: Conjur